Meu bem, meu mal

“Bem” e “mal” são advérbios e, por isso, invariáveis, ou seja, não flexionam em gênero nem em número*.

*A única possibilidade de flexão de número é quando “mal” ou “bem” exercem função de substantivo.

O mal da alma é a solidão.

Os males da alma são a solidão e a indiferença.

O carro é o único bem que ele possui.

O carro e a casa são os únicos bens que ele possui.

Um advérbio, como o próprio nome dá spoiler, é um termo que acompanha/modifica um verbo.

Aqueles pais educaram bem os filhos.

Aqueles pais educaram mal os filhos.

Mas “bem” e “mal” podem se unir a outras palavras e formar um adjetivo.

São crianças bem-educadas.

São crianças mal-educadas.

Ou podem continuar como advérbios (e, por isso, sem hífen).

Eles foram bem educados pelos pais.

Eles foram mal educados pelos pais.

No caso de formarem adjetivos, a regra é clara:

MAL: só exige hífen quando a palavra seguinte começar por “h” ou por “vogal”.

Mal-humorado, mal-amado, mal-educado, mal-acabado, mal-informado, mal-estar…

Malfeito, malcriado, maldito, malmequer…

BEM: sempre exige hífen, mas aceita outras formas também.

Bem-humorado, bem-feito, bem-dito, bem-estar, bem-me-quer…

Bendizer ou bem-dizer, benquerer ou bem-querer…

Nó no cérebro 1: “bem-me-quer” tem hífen porque é uma espécie botânica. É um outro nome para calêndula. Malmequer também, mas não tem hífen, é tudo junto.

Nó no cérebro 2: “mal-francês” tem hífen porque é uma doença. Não está ligando o nome à pessoa? É o mesmo que sífilis

Disse que disse

Em textos informativos, as citações são recursos muito preciosos para a construção do tema.

Essas citações podem ser diretas, quando são escritas exatamente as palavras proferidas pela fonte; ou indiretas, quando o autor do texto reescreve a fala, respeitando o conteúdo.

Mesmo sendo um bom recurso, não é bom exagerar. Não vale colocar um parágrafo de seis linhas todo em forma de citação direta. Fica pouco objetivo e empobrece o texto.

E, quando a fonte não é exatamente um primor de oratória, fica sempre mais elegante usar a citação indireta.

As aspas marcam o uso de citações diretas. A pontuação dessas citações foi apresentada aqui.

Muito cuidado com as frases interrogativas que, nas citações indiretas, viram frases afirmativas e, portanto, perdem o sinal de interrogação.

“Por que o avião não está pronto?”, esbravejou a presidente.

A presidente perguntou por que o avião não estava pronto.

Além da pontuação, quando tratamos de citações, precisamos tomar cuidado com os verbos declarativos ou declaratórios. São aqueles verbos que aparecem antes ou depois de uma citação direta.

Normalmente, eles são usados no tempo pretérito, mas o presente também é uma opção. Só não é permitido misturar os tempos no mesmo texto.

Temos também que atentar ao significado desses verbos. Vou usar um exemplo que o Vinicius Doria sempre cita.

“Talvez a decisão seja tomada ainda nesta semana”, afirmou o assessor.

Quem afirma está assinando embaixo, está certo de alguma coisa. A palavra “talvez” denota dúvida e não combina com o verbo declarativo escolhido.

Segue uma lista de verbos declarativos que podem ser usados em nossos textos. Ela não é exaustiva. Praticamente todos os verbos de ação podem desempenhar esse papel. Desde que o significado esteja de acordo.

Acreditar, admitir, acrescentar, afirmar, advertir, alegar, alertar, analisar, apontar, argumentar, aconselhar, assegurar, assumir, citar, comentar, concluir, comemorar, confessar, cobrar, completar, complementar, criticar, confirmar, constatar, contradizer, contar, contra-atacar, dizer, destacar, determinar, elogiar, enaltecer, enumerar, esclarecer, estimular, exemplificar, exigir, exaltar, explicar, explanar, expor, finalizar, frisar, garantir, insinuar, instruir, imaginar, indicar, indagar, lamentar, lembrar, mencionar, opinar, observar, orientar, ostentar, pensar, pedir, perguntar, pressupor, prometer, ponderar, provocar, propor, prever, planejar, questionar, rechaçar, recomendar, responder, relatar, realçar, ressaltar, respaldar, retribuir, reconhecer, salientar, sugerir, sugestionar, sustentar, valorizar

A vida secreta das palavras

Existem palavras que parecem seres abissais: vivem nas profundezas dos alfarrábios e causam grande estranheza a quem topa com elas, seja por lazer ou por trabalho. Com formatos estranhos, assemelham-se mais a invenções de algum escritor de criatividade extrema.

Outro dia, meu querido amigo Orlando Brito – ele mesmo um talento abissal na arte da fotografia – ao escrever sua coluna Fotografia É História,  deparou-se com uma dessas palavras pouco usuais. Em uma primeira olhada, acreditou ser um erro ortográfico, mas veio conversar comigo para tirar a dúvida.

A palavra era “ombridade”. Assim, sem “h”. “Hombridade” ele conhece – e exerce – de sobra: é sinônimo de “honradez”. Mas “ombridade”, assim despida do “h” inicial? Não… devia ser erro.

Não é. “Ombridade” existe. Significa “qualidade de quem ombreia, de quem se coloca em posição de igualdade”. Vem de “ombro”. Daquele hábito de encostarmos os ombros para saber se a altura é a mesma.

Houaiss nos traz um exemplo da palavra aplicada em uma frase: “Pretensão de ombrear-se com alguém que lhe é superior”.

Mas, cuidado: quando se trata de “honradez” ou, de uma forma mais coloquial, de “vergonha na cara”, a palavra é escrita com “h”. E pode ser associada a homens e a mulheres, indiferentemente: “Ela teve a hombridade de assumir”.

Cerca de/Perto de/Em torno de

Quando usamos as expressões “cerca de”, “perto de”, “em torno de” e outras que indicam aproximação de quantidade ou de valores, é porque não temos a quantidade ou o valor exato.

Sendo assim, o correto é usar números redondos.

A manifestação reuniu cerca de 10.000 pessoas.

É um erro usar números “quebrados” com tais expressões, pois esses números acabam por contradizer o sentido da expressão.

Foram empenhados em torno de R$ 2.647.202,00 no processo de reformulação da fábrica.

O correto seria:

Foram empenhados em torno de R$ 2 milhões (ou R$ 3 milhões) no processo de reformulação da fábrica.

Só para implicar: é mais ou menos como quando usamos a expressão “é muito pouco”. É muito ou é pouco? É exato ou é aproximado?

Por que eu não compartilho algumas postagens no Face?

Por isso:

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Basta só ALGUNS MINUTOS? Sujeito no plural e verbo no singular?

Esse é um risco assumido por quem usa muita inversão da ordem direta. O natural é: sujeito + verbo + complementos. Ao inverter, deve-se prestar o dobro da atenção.

O correto é: Bastam só alguns minutos. Já basta a mágoa, né?

As aspas e o ponto

Uma dúvida muito frequente é quanto à posição do ponto quando usamos aspas. O ponto deve ficar antes ou depois das aspas finais?

Depende da situação.

Quando o período inteiro está entre aspas, o ponto deve vir antes das aspas finais.

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Já quando o período não está inteiro entre aspas, o ponto vem depois das aspas finais.

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E quando a citação, que vem entre aspas, é finalizada com um ponto de exclamação ou de interrogação?

Se o período inteiro estiver entre as aspas…

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Se o período não estiver inteiro entre aspas…

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A vírgula do vocativo

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A análise de hoje é direcionada a várias frases que foram usadas nas manifestações de domingo (16/8). Em comum, a indignação com o governo e o erro de pontuação.

“Fora Dilma!”

“Fora corruptos”

Ambas as frases são formada por três palavras. Você está vendo duas? É porque uma delas está subentendida. É um verbo. Que pode ser “caia(m)”, “saia(m)”, de acordo com o gosto do freguês.

Esse verbo subentendido está no imperativo, forma verbal que indica uma ordem ou um pedido (no caso, está mais do que claro o que é…).

Todas as vezes que usamos o imperativo, a pessoa-alvo da nossa ordem ou pedido não tem papel de sujeito na frase, uma vez que a ação pode não ser realizada. Essa pessoa-alvo do imperativo é um vocativo. 

O vocativo não tem relação sintática com outros termos da oração. Não pertence ao sujeito nem ao predicado. Vem sempre isolado por vírgula.

Por isso, as frases de protesto ficariam corretas se assim fossem escritas: “Fora, Dilma!” ou “Fora, corruptos”.

Oficina de texto – Preocupação

Mais um trecho para analisarmos e corrigirmos.

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Está sobrando alguma coisa, certo? A preposição “de” não deveria estar aí, entre o “é” e o “que”.

Esse é um típico caso de erro por contaminação, ou erro por excesso. Em algumas situações, a preposição “de” é necessária:

“Não tenho dúvida de que as alterações serão feitas”.

No exemplo acima, a construção é totalmente diferente do trecho destacado no texto. Mas, mesmo que deixássemos as construções iguais, ainda assim não haveria necessidade do “de”. Veja:

Minha preocupação com as reuniões dos senadores era justificada.

Percebeu? A preposição que normalmente acompanha “preocupação” é “com”. A preposição “de” estabeleceria uma relação de posse: “a preocupação da (de+a) menina”.

Cuidado com os excesso e com as contaminações!

Para finalizar, que redação fica mais enxuta e, por isso, mais elegante?

(1) A preocupação relativa ao procedimento de abertura da CPI…

(2)  A preocupação com o procedimento de abertura da CPI…